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Incerteza e confiança: o que aprendi observando líderes em ambientes complexos

Trabalhei com muitos líderes em momentos críticos: fusões, cisões, crises, reestruturações, metas desafiadoras de vendas, dificuldades na entrega ao cliente, pressão do board, desalinhamento entre áreas etc.

E uma constante sempre me chamou atenção: quanto maior a incerteza, menor parecia ser a confiança entre as pessoas.

Mesmo equipes experientes, técnicas e comprometidas começavam a duvidar umas das outras.

Encontrei uma explicação estruturada para esse fenômeno ao ler mais um bom artigo do colunista do Valor Econômico Claudio Garcia: ‘Como a incerteza corrói a confiança nas organizações’ (08/05 /2025).

No texto, o autor mostra como a chamada ‘hiper incerteza’ vem fragilizando silenciosamente a confiança interpessoal nas organizações.

Detalhe importante: em uma sondagem com mais de 200 profissionais — feita por ele em parceria com dois amigos —, 56% afirmaram confiar menos em seus colegas do que há quatro anos.

A conclusão: sensações de medo, ansiedade e sobrecarga emocional são fatores que nos tornam mais suscetíveis a decisões apressadas, culpabilizações e distanciamentos dentro dos times.

💡 Nisso tudo, qual é o nosso ponto cego?

É a forma como reagimos à incerteza. Em vez de reconhecê-la como parte do jogo complexo, buscamos soluções rápidas e certezas absolutas, o que mina a colaboração e alimenta a desconfiança. A investigação revelou que boa parte da desconfiança entre pessoas nasce justamente da dificuldade em lidar com a incerteza.

E mais: no ambiente corporativo, isso se intensifica: valoriza-se a autoconfiança, pune-se o erro e a insegurança é projetada no outro — afinal, se a culpa não é minha, alguém precisa ser responsabilizado.

Quando isso acontece, deixamos de aprender.  Basicamente, líderes que não reconhecem sua própria insegurança tendem a cobrar mais da empresa e dos outros, em vez de buscar novas formas de agir. O desenvolvimento trava. E o ambiente se torna mais rígido e menos empático.

🤝 Mas há uma saída. E ela começa com outro tipo de presença.

Garcia propõe o conceito de co-accountability: líderes que não precisam ser inspiradores ou sofisticados, apenas presentes. Que estão ao lado de suas equipes quando a incerteza aparece, oferecendo suporte real, recursos adequados e espaço para diálogo. Não para fazer pelas pessoas, mas para ajudá-las a ter sucesso com o que foi confiado a elas. Essa presença ativa e acessível é o que sustenta a confiança mútua e permite que cada um se sinta verdadeiramente responsável e capaz de contribuir.

🌱 E o que muda o jogo?

Confiança mútua – quando a confiança se estabelece, o ambiente se transforma: do defensivo ao criativo, do individualismo à cocriação. As pessoas não se sentem apenas responsáveis — sentem-se apoiadas para ter sucesso juntas.

🔄 Confiança não nasce da estabilidade em tempos de complexidade. Confiança cresce na presença real, na escuta ativa e no compromisso com o sucesso do outro.

E talvez seja exatamente isso que mais precisamos reconstruir: um jeito mais humano, empático e resiliente de trabalhar — de dentro pra fora.

Referência: Artigo “Como a incerteza corrói a confiança nas organizações” de Claudio Garcia — Professor de gestão global e estratégia na Universidade de Nova York. Publicado no Jornal Valor Econômico, edição de 08/05/2025.